" Há algumas flores do amor que abrem só depois de longa intimidade." Osho

Beijo da Escrita


Eu escrevo como quem beija.
Um beijo longo, demorado, carinhoso.
Um beijo desses de língua.
A língua se movimenta lentamente
e me permite um gosto
ao mesmo tempo do outro
e de mim mesma.

Do outro que me encontra
neste texto
e do que há em mim que permite o encontro.


Eu escrevo como quem vive.
Assim, simples,
fazendo um texto de vida,
na vida.
Às vezes, penso,
afinal, que texto é esse que eu produzo?
Que vida é essa agenciada
pelo sabor das palavras compartilhadas,
sussurradas, como um afago?


Quem é esse outro que me encontra
e quem sou esse eu mesma que se expressa,
que se entrega...
nesse delicioso beijo de língua?
Nesse movimento que, afinal,
eu mesma provoco?
O gosto vem do meu movimento mesmo
associado ao movimento do outro.


Quando escrevo, eu me inscrevo.
Fica também o meu gosto
no gosto da língua do outro.
E isso me remete a não querer parar de escrever.Nunca.





quarta-feira, 21 de abril de 2010

Sacrifício: tornar sagrado o oficio



Dia desses a palavra “sacrifício” chamou minha atenção. Os contextos foram os mais variados. Decidi buscar o significado da palavra, pois a intuição me cutucava para uma bela lição. Lá fui eu ao ....dicionário. E, no Aurélio:


Sacrifício: 1. Ato ou efeito de sacrificar-(se);


2. privação de coisa apreciada;


3. renúncia em favor de outrem
Fui mais a fundo na pesquisa, cheguei à origem da palavra. E ela vem do latim sacro oficium , ou seja, “oficio sagrado”, quer dizer mais ou menos “tornar sagrado aquilo que se faz”, seja lá o que for. É ir além, é tocar o intocável. Não sei se consigo passar o que a intuição levou-me a pescar. Entendi porque muitas vezes atividades feitas, ou mesmo escolhas que fiz, tinham um “quê” diferente. Algumas vezes senti o peso do segundo significado da palavra, ou seja, a privação de algo apreciado fora maior do que o desejo inconsciente – naquele momento – de tornar o ato sagrado.

Percebi o quanto, nós mortais, na maioria das vezes, somos inconscientes do que fazemos, do por que fazemos e para que fazemos. Compreendem? Criamos nossa própria realidade a partir das escolhas feitas e a partir delas colhemos seus frutos.

Entretanto, inúmeras vezes a lamuria do quanto nos sacrificamos em prol de alguém, de uma situação, de uma causa e com isso estamos cobrando aquilo de que estamos sendo privados, quando na verdade deveríamos ser gratos pela oportunidade que nós mesmos criamos para tornar sagrado o que estamos fazendo. Afinal, nossa condição humana leva-nos a querer transcender essa condição. Mas, no momento, ao choramingar, como crianças mimadas, perdemos a chance e com ela o peso do ato torna-se realmente insuportável.

Entendi que em cada final de ciclo – e entenda-se aqui final de ciclo por etapas vivenciadas ao longo da vida – somos colocados em situações de “sacro oficium”. Situações essas que oportunizam a escolha do sacrificar-se em prol de algo maior ou não. E aqui o maior não tem a ver com grandioso, mas sim com algo de significação para nosso aprendizado. Algo que a própria Alma almeja alcançar, pois faz parte de sua trajetória.

Essa travessia é delicada, pois ao colocar o enfoque na privação somos levados ao peso da escolha, que nos leva ao medo, que nos leva a lamuria e a densificação (entenda-se materialização da energia negativa) do medo – muitas vezes cristalizado em doenças.

Agora, quando se consegue enfrentar com alegria e leveza o sacrifício, sem focar a privação nem o quanto isso nos pesa, alcançamos além do aprendizado a transcendência para um novo estágio de ensinamentos. Somos alçados a um novo patamar, onde somos eternos aprendizes. A humildade, nesse caso, é uma chave para abrir as portas que se encontram nesse novo estágio.

A vida tem mecanismos incríveis para nos conduzir, basta que estejamos alertas, dispostos ao aprendizado. Até uma palavra tão simples, dita inúmeras vezes inconscientemente, esconde ensinamentos.

Margarida Kröeff



Nenhum comentário:

Postar um comentário